terça-feira, 15 de novembro de 2011

Novembro Negro

Fico pensativo, quase depressivo toda vez que se aproxima o dia da consciência negra!
Pior, tão certo como o amem na oração, nessa ocasião vem sempre alguém dizendo que Salvador é o maior reduto negro fora da África!
O que será que querem dizer com isso?
Será que querem afirmar que nós podemos-nos orgulhar dos "trocentos" quilômetros quadrados de pele negra de nosso povo?
Logo, logo vem o carnaval e o concurso da Deusa de Ébano, com a vencedora balbuciando as palavras mágicas obrigatórias: "negritude e ancestralidade.
Enquanto isso há quem repita à exaustão que a desordem, a bagunça de nossa cidade é culpa do negro pobre da periferia!
Nessa hora estou com a pressão arterial de 45 por 13 e a caminho da UTI mais próxima!

Consciência negra para mim é outra coisa!
Consciência negra para mim é afirmar entre outras coisas que ser negro em Salvador não é nenhum mar de rosas! Muito pelo contrário!
Justamente aqui na Bahia o lobby da casa grande e de uma pretensa "zelite maomeno branca" são fortíssimos, contando com o poderoso apoio de Hollywood e da televisão nativa!

Vejamos, se antigamente era glamouroso imitar atrizes e atores de cinema, fumando cigarros, a garotada soteropolitana de hoje adora imitar os trejeitos um tanto negligentes e desdenhosos de sinhozinhos e sinhazinhas, de coronéis e cadetes anacrônicos.

É claro que isso é apenas mais uma maluquice minha! A loucura de um austríaco de alma negra, enxergando nessa imitação uma suposta perda de identidade do negro!
Será que existe negro de alma branca?

Se o nosso tecido social está meio amarrotado e esfarrapado, acho bom a gente procurar a razão na casa grande, não na senzala!

Quem tiver algum interesse, que procure conhecer o modo de vida e a religião dos africanos outrora escravizados na Bahia.
Quem tiver algum interesse por cultura e religião de matriz africana, vai descobrir ordem, conhecimento e respeito no trato com o próximo!
Vai perceber a riqueza de cuidados com a cultura, com a comida, cada uma sendo preparada entoando cantigas próprias, distinguindo comida de azeite, de carne e comida seca, ou seja, de folhas e grãos. Conhecimentos que engrandecem a Bahia!

Consciência negra para mim é cultivar essas raízes a começar pelas saudações, o respeito e o cuidade ostensivo para com o outro, com a memória dos ancestrais!

É o que eu gostaria de dizer para a nossa garotada nesses dias que antecedem o dia 20 de novembro.(1)
É o que eu gostaria de dizer neste novembro de 2011, meio século sem negros importantes como Frantz Fanon e Patrice Lumumba.

alãafiá fun gogbo ará dúdú

Reinhard Lackinger
onileounjé ni Bistrô PortoSol(

1) Se houver clima, diria ainda que nossas raízes não estão na Jamaica e sim na África ocidental e equatorial... e que apesar de gostar do reggae e não tolerar o pagode, nossas raízes estão no samba de roda!

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Série global sobre comida japonesa

A comida japonesa pode não agradar a todos, mas tem um detalhe importante: ela mostra como aproveitar ingredientes simples e com aspecto um tanto exótco.

Alimentos, que outras culturas simplesmente desprezam, considerando-os impossíveis de trabalhar, os japoneses transformam em pratos saudáveis, com apelo visual deslumbrante.

Na verdade, não entendo nada da culinária do sol nascente.
Entendo sim da felicidade estampada no rosto de quem come gostoso!

Assistindo outro dia à matéria da Globo sobre a comida de Kyoto / Japão, não posso afirmar ter visto alegria no rosto do repórter global Roberto Kovalick ao experimentar um peixe (1) espinhento pra dedéu!
O que eu vi no semblante dele foi apreensão e o desejo premente de que o câmera desligasse a porcaria da máquina dele!

(1) O idioma japonês tem várias palavras oriundas das línguas ibéricas. "Copo", por exemplo. Presume-se que o primeiro biriteiro naquela terra era brasileiro... ou "Pan". Imagino que primeiro padeiro no japão tenha sido um galego. Finalmente Peixe em japonês é "Sakaná". Devem tê-lo chamado assim depois de comer o tal pescado espinhento que Kovalick encarou outro dia.
Mais uma maluquice patrocinado pelo taverneiro Reinhard do Bistrô PortoSol,onde se come gostoso sem sacanagem! hehe

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

GPS.. e o que mais vão inventar!




Idoso como eu, há décadas venho testemunhando a própria obsolescência.

Sou de uma época, em que certas profissões exigiam força muscular. Quem era fraquinho demais para pegar no pesado, virava confeiteiro, barbeiro ou alfaiate. Por outro lado, ferramenteiro, serralheiro e ferreiro tinha que ter habilidade manual.

Isso tudo acabou, ou quase.


As máquinas operatrizes com comando numérico fazem o produto acabado, sem necessidade de qualquer ajuste.

Hoje, o computador faz praticamente tudo. Aquela máquna de escrever, que imprimia o texto enquanto a gente digitava, desapareceu logo depois daquela calculadora Facit, pesando uns 15 quilos.

Já em 1975, prevendo calculadoras cada vez menores, e sabendo não ser possível diminuir o dedo, projetei um dedal com uma ponta fina, capaz de digitar os números certos até em calculadoras japonesas pequeninas. Sofisticação desse meu projeto hilário era a maneira de como fixar o dedal na ponta do dedo. Previ um parafuso de meia polegada de diâmetro com rosca grossa e cabeça sextavada, apertando justamente a unha do dedo indicador.

Tudo isso é neve de invernos passados! Atualmente, habilidade com extremidades, boca e língua, só jogador de bola, acrobata, músico, e cozinheiro. Perdão, esqueci a bunda da dançarina de axé, parangolé e funk.

Idoso como eu, vê toda essa evolução com certa reserva. Há quem veja em todos esses brinquedos eletrônicos uma perigosa armadilha e um caminho irreversível para a solidão humana!

Ouvi falar de games imitando a realidade, bem como de uma nova geração, que não larga o controle, o joy stick durante horas e mais horas, passando dias e noites sozinha diante do computador, conectada com o mundo através de facebook e outros ambientes virtuais, assistindo a filminhos do Youtube.

Ninguém mais escreve, manda, aguarda ou recebe cartas de alguém distante. Os amigos, que viajaram outro dia para o exterior, diariamente enviam fotos e filmes através do notebook, falam pelo skype, passeando com a câmera pelo quarto do hotel, mostrando a vista que têm da janela. E por falar em hotel, foi o GPS que os guiou até a porta.


Idoso como eu tem dificuldade em aceitar essas novidades eletrônicas. Eu olho para as fotos lá da Europa e vejo muito asfalto, muito passeio e poucos automóveis e ainda menos transeuntes. Muita urbanização para relativamente pouca gente.

Se na época em que meus familiares austríacos ainda estavam vivos, cada um morava só nos quatro paredes, imagine agora.

A certeza social, fruto de mais de meio século sem guerra, fez com que o cidadão pudesse viver tranquilo numa bolha invisível, não tendo que falar com ninguém, muito menos precisando defender o seu espaço de gente folgada!

As pessoas vivem só e morrem só! Uns são achados apenas em avançado estado de putrefação, vários anos após a morte. Não pelo fato de algum parente, amigo ou vizinho desse por falta, mas porque a correspondência acumulada diante da porta do sujeitro ameaçava impedir a passagem dos vizinhos.


Agora, depois de toda essa parafernália eletrônica, condenando as pessoas à solidão, vem ainda o maldito GPS.


Idoso como eu, também fica tempo demais diante do computador, mandando e-mails tipo "mala diretga sem alça", achando que assim cativa pessoas, fazendo com que venham até o mundinho de pensamentos dele, quem sabe, até ao Bistrô PortoSol.

Se há alguma geringonça eletrônica que não pretendo usar jamais, essa é o GPS. Não porque julgo ter algum conhecimento de geografia, mas porque gosto de perguntar aos transeuntes, às pessoas à beira das estradas. Interagir com estranhos em terras estranhas faz parte de minha maneira de viajar. Minha mulher Maria Alice, graças a Deus, embarca nesse passeio.

Fiquei sabendo que essas facilidades eletrônicas não são completamente seguras e que diversos condutores de veículos equipados com GPS acabaram num riacho ou num caminho lamacento entre plantações de beterrabas e milho.

Também tenho tido problemas ao perguntar pela direção certa. Viajando na época dos conflitos sangrentos na antiga Yugoslávia por países como Alemanha e Áustria, de 10 pessoas que perguntei, 13 responderam com forte sotaque do Leste Europeu, lamentando não poder ajudar. Era difícil achar algum nativo na rua. Pareciam todos embiocados em casa diante do novo televisor digital. Curtindo um passeio ao ar livre, aparentemente só bósnios e outros refugiados dos balcans. Eles pareciam adorar poder caminhar pela natureza, sem o receio de pisar numa mina terrestre.


Taverneiro idoso que sou, fico tempo demais diante do computador, redigindo baboseiras como essa, mandando e-mails e colando textos mais ou menos sérios no meu blog, porém pela manhã, você me vê correndo atrás de ingredientes e de terça feira a sábado, a partir das 18:37h passo horas a fio sem computador, interagindo com minha querida clientela do Bistrô PortoSol e espantando não-clientes! hehehe



Reinhard Lackinger

o taverneiro do Bistrô PortoSol